Acutipupu - Era
uma mulher-homem que habitava entre a gente da Serra do Japó. "Acutipuru
paria crianças fêmeas, bonitas como as estrelas do céu. Quando emprenhava as
mulheres - na sua função de homem -, estas pariam crianças machos bonitos
como o sol. Teve um filha, Erem, gerada por Uaiú que então andava na Serra do
Japó impondo a lei de Jurupari. Um dia Uaiú quis fazer amor com a filha Erem.
Ela recusou-se, fugiu. Casou-se com um chefe, Cancelri, originou uma guerra que
terminou com o extermínio de sua gente".
Ahó Ahó - Era
um grande animal de pêlo farto e veludoso. Algumas vezes como uma ovelha,
outras como um urso. Persegue e devora indivíduos que se perdiam nas florestas.
Escapavam apenas os que subiam a uma palmeira, por ser esta a árvore sagrada do
Calvário. Se, entretanto, subisse em qualquer outra árvore o Ahó Ahó cavava
junto às raízes até derrubar o vegetal; quando esta batia ao chão ele
devorava a vítima.
Alamoa - Sempre
antes de uma tempestade violenta aparece na praia, de noite, a Alamoa. Lembra
uma Iara, pois tem cabelos longos, se bem que louros, o que justifica seu nome.
Não veste qualquer coisa e põe-se a dançar à luz dos relâmpagos. Homens que
a vêem e não fogem à essa terrível visão, morrem de pavor, deixando somente
o branco esqueleto. Dizem tratar-se de uma alma a cumprir pena, da qual somente
se verá livre se impressionar homem valente o suficiente para desenterrar o
tesouro que jaz no cume do Pico da Ilha de Fernando de Noronha.
Amazonas -
"São muito alvas e altas, com o cabelo muito comprido, entrançado e
enrolado na cabeça. São muito membrudas e andam nuas em pêlo, tapadas as suas
vergonhas, com os seus arcos e flechas nas mãos, fazendo tanta guerra com dez
índios"... "lutavam tão corajosamente que os índios não ousavam
mostrar as espáduas, e ao que fugia diante de nós, o matavam a pauladas".
"...residiam no interior, a sete jornadas da costa. Eram sem marido.
Dividiam-se, numerosas, em setenta aldeamentos de pedra, com porta, ligadas as
povoacões por estradas amparadas, dum e doutro lado, com cercas, exigindo
pedágio aos transeuntes. Quando lhes vinha o desejo, faziam guerra a um chefe
vizinho, trazendo prisioneiros, que libertavam depois de algum tempo de
coabitação. As crianças masculinas eram mortas e enviadas aos pais e as
meninas criadas nas coisas da guerra. A rainha se chamava Conhori. Há riqueza
imensa de ouro, prata, serviços domésticos em ouro para fidalgas e de pau para
as plebéias. Na cidade principal havia 5 casas grandes, com adoratórios
dedicados ao Sol. As casas de devoção são os Caranai. Têm assoalho no solo e
até meia-altura, os tetos forrados de pinturas coloridas. Nesses templos estão
ídolos de ouro e prata em figuras femininas e muitos objetos preciosos para o
serviço do Astro-Rei. Vestem finíssima lã de ovelha do Peru. Usam mantas
apertadas, dos peitos para baixo, o busto descoberto, e um como manto, atado
adiante com uns cordões. Trazem cabelos soltos até o chão e na cabeça coroas
de ouro, da largura de dois dedos".
Añá - Era o
deus do puro mal. Era o espírito mau por excelência. Molesta os homens e
arrasta as crianças que brincam junto das fontes.
Anhangá - Mito
dos índios brasileiros, a alma errante (tupi ang), que tomava o aspecto de
fantasma ou de duende, vagando pelos campos e florestas. Há vários tipos, como
mira-anhanga, tatu-anhanga, suaçu-anhanga, tapira-anhanga e até
pirarucu-anhanga - isto é, aparição de gente, de tatu, de veado, de boi e de
pirarucu. Em geral, não era benfazero. Sua simples lembrança trazia pavor ao
silvícola e ao homem simples do campo. Era a própria corporificação do medo
informe, do pavor do desconhecido e do mistério da noite. É um dos mitos mais
antigos do Brasil. O Anhanga, segundo a tradição, metamorfoseava-se mais em
veado.
Arranca-Língua - Monstro dos sertões do Estado de Goiás. Nas cidades chamam-no de King-Kong.
Outro nome com o qual é chamado é o de Bicho-Homem. Seria um tipo humano,
peludo, escuro, que se alimentava das línguas das vacas. Este é, pois, seu
malefício: dizima rebanhos inteiros para comer somete a língua. Ataca
desferindo urros paralizantes. Deixa pegadas nítidas, de aproximadamente 48
centímetros.
Avati - É
herói guarani. Em uma época de grande fome, dois guerreiros procuravam algo o
que comer quando depararam-se com um enviado de Nhandeiara - o grande espírito.
Este disse-lhes que a solução para a sua procura inútil seria uma luta de
morte entre os dois. O vencido seria sepultado no local em que caísse e logo do
seu corpo brotaria uma planta cujas sementes, replantadas e depois comidas
resolveriam para sempre o problema com alimentação. Assim fizeram. Avati, um
dos dois, foi morto e de sua cova nasceu a planta de milho.
Barba Ruiva -
Era um homem de cabelos e barbas avermelhados. De tempos em tempos, sai da água
e deita-se na areia tomando banho de sol. Quem o viu afirma que traz as barbas,
as unhas e o peito cobertso de lodo. Não foge ao encontrar os mortais, mas
nunca lhes dirigiu qualquer palavra. Apesar de pacífico , é objeto de medo e
todos fogem dele. Diz-se que era filho de uma mulher que não o desejava e esta
o jogou em uma caçimba. Imediatamente depois, do solo, água abundante surgiu e
criou-se um lago onde, à noite, ouviam-se relinchos, bater de pratos e o choro
de uma criança.
Boitatá - É a
versão brasileira do mito do fogo-fátuo ou de saltelmo existente em quase
todas as culturas. Seria uma cobra-de-fogo que vagava pelos campos protejendo-os
contra aqueles que os incendeiam. Às vezes, transformava-se em grosso madeiro
em brasa que fazia morrer, por combustão, aquele que queima inutilmente os
campos. É um mito dos mais antigos e quase totalmente de origem indígina. O
mito do Boitatá recebe, no Nordeste, a denominação de fogo-corredor,
baitatá, jã-de-la-foice (Sergipe), etc.
Boiúna - É
descrito por Alfredo da mata: "...transforma-se em mais disparatadas
figuras; navios, vapores, canoas... engole pessoas. Tal é o rebojo e cachoeiras
que faz, quando atravessa o rio, e o ruído produzido, que tanto recorda o
efeito da hélice de um vapor. Os olhos quando fora d'água semelham-se a dois
grandes archotes, a desnortear até o navegante". Faz parte do ciclo
mítico de "como surgiu a noite", segundo a qual a Grande Cobra casa a
filha e manda-lhe a noite presa dentro de um caroço de tucumã. Os portadores,
curiosos, abrem o caroço, libertam a noite e são punidos.
Boto - É,
certamente, o animal amazônico de maior presença folclórica. Seduz as moças
ribeirinhas descuidadas. É, assim, o pai de todos os filhos "de origem
desconhecida". Sobre ele narra-se o seguinte: "Nas primeiras horas da
noite transforma-se em um belo rapaz, alto, branco, forte, grande dançarino e
bebedor, e aparece nos bailes, namora, conversa, freqüenta reuniões e
comparece fielmente aos encontros femininos. Antes da madrugada pula para a
água e volta a ser o boto". Falou-se ainda: "A sorte dos peixes foi
confiada ao Uauiará. O animal em que ele se transforma é o boto." O
Uauiará é legítimo filho da selva e tão conquistador quanto o Boto. Conta-se
uma história incomum sobre o Boto: "Dois pescadores, de vigia, sacuriram
três arpões de inajá (N. do Webmaster: inajá, espécie de palmeira) num
vulto de homem que freqüentava certa casa na margem do rio. O homem fugiu e
deitou-se à água. No outro dia boiava um grande Boto com três arpões de
inajá fincados no dorso".
Bradador - É
um duende que assusta os sertões dos Estados de Santa catarina, São Paulo,
Minas Gerais e Paraná. Emite berros altos, "compassados, intermitentes e
horríveis". "... Atravessa os campos, correndo, todas as
sextas-feiras, depois da meia-noite. É uma alma penada. Afirmam os caboclos que
se trata do espírito de um corpo seco, ou melhor, de uma múmia, que foi
desenterrada do cemitério do povoado Atuba (próximo de Curitiba) e jaz
encostada a um pé de imbuia, completanto o seu fado material sobre o
solo..." Diz a lenda que a terra não o aceita e só o fará quando este
cumprir sua sina.
Cabeça de Cuia - É um ser alto, magro, de cabeleira farta que lhe cai sobre a testa e que
sacode quando nada nos rios da região do Maranhão e do Piauí. Faz suas
viagens durante as enchentes do rio Paraíba. De sete em sete anos sai a procura
de uma moça, que tem que se chamar Maria; às vezes, porém, devora crianças
que estejam nadando no rio. Cabeça de Cuia era um rapaz que não obedecia sua
mãe e a maltratava e terminou por deixar a casa da família. Sofreu, então,
uma maldição da mãe e foi condenado a viver durante 49 anos nas águas do rio
Paraíba. Somente depois de comer 7 Marias é que poderá voltar ao seu estado
normal. A lenda diz que sua mãe viverá enquanto ele estiver nas águas do rio.
Caipora - Um
dos gênios da floresta na mitologia tupi. É representado como um pequeno
índio, negro, ágil, que fuma cachimbo e reina sobre tudo o que existe na mata.
Quem o encontra fica infeliz nos negócios e em tudo o que empreende. No estado
do Ceará, o Caipora tem cabeleira hirta (N. do Webmaster: "Hirta",
ereta) e olhos de brasa. Calvaga porco ou caititu (N. do Webmaster:
"Caititu", porco do mato, espécie de javali) e agitando um galho de
japecanga. Pode ser um caboclinho da mata, com poderes encantadores e rastro
redondo e um olho só no meio da testa. O Caipora, através do contato do
focinho do porco que cavalga, da vara de ferrão, do galho de japecanga ou de
uma simples ordem verbal, pode ressuscitar os animais mortos sem sua permissão,
apavorando assim os caçadores. Os indíginas e também os sertanejos
defendiam-se dle andando com um tição flamejante durante as jornadas noturnas.
O Caipora foge instintivamente da claridade. É um gênio da floresta quase
igual ao Curupira e ao Saci Pererê. Assemelha-se a outros personagens míticos
como ao Yastay argentino que guiava as manadas de guanacos e vicunhas,
defendendo-as da dizimação.
Ci - Segundo as
crenças indígenas tudo e todos possuem uma mãe. Esta seria Ci. Homens,
minerais, plantas, animais, água, terra, fogo e ar... tudo; nasciam e eram
protegidos por uma respectiva Ci, mãe criadora. "Esta mãe gerou, modelou,
criou, regulamentou, governa e em muitos casos alimenta permanentemente seus
filhos sem nenhuma necessidade do elemento masculino. Este é um fator
característico importante: a maioria dos povos cultuam um pai, um ser
masculino, o macho; o índio brasileiro, porém, considera apenas a fêmea - Ci.
"O sono, a chuva, o verme, o sorriso, a fonte, a canoa - tudo tem mãe e
todo indígena sabe quem é a mãe de cada coisa. Jamais fala do pai eventual
das mesmas coisas. O índio brasileiro não considera a reprodução sexuada em
seu universo".
Coroaci - O
deus Sol para os Tupis ou os Nheengatus. O nome significa "Mãe deste
dia".
Coniapayaras - "Mulheres senhoras de si", "mulheres soberanas", ou seja, a
denominação Tupi para às Amazonas.
Cuca - É,
certamente, o mais difundido mito do ciclo do medo infantil. Não tem
características físicas definidas (apesar de Monteiro Lobato, grande escritor
Brasileiro, imaginá-lo como sendo um grande jacaré verde com as costas
coloridas em vários tons e com uma cabeleira branca enorme que lhe cai até
próximo do início da longa cauda). Sabe-se que leva os infantes insones para
um sítio distante e misterioso onde deverão ser devorados ou fazer parte em
alguma magia qualquer.
Curupira - O
Curupira é representado como um garoto (moleque) de cabeleira vermelha, pés
invertidos: dedos para trás e calcanhar para frente. É o protetor das árvores
e da caça, senhor dos animais que habitam a floresta. Antes das grandes
tempestades percorre a floresta batendo nos troncos das árvores certificando-se
de sua resistência. Não é um gênio bom, é antes enganador e mesmo
assassino: os seus pés virados deixam rastros falsos no chão, iludindo os
perseguidores. Engana viajantes e caçadores, transviando-os dentro da mata com
assobios e sinais falsos. Também é chamado de gênio da mentira. Pode,
contudo, ter contatos amistosos com alguns caçadores, dando-lhes armas e
transmitindo certos segredos que, quando revelados, são fatalmente punidos.
Isto é feito em troca de comida. O Curupira assemelha-se em suas atribuições
à bela Diana dos romanos e à Ártemis dos gregos, protetoras dos bosques e da
caça.
Iara - A beleza
tentadora das águas não é mito ameríndio nem africano. O nome Iara, de Ig,
água, e iara, senhora, foi literariamente composto. Na Amazônia, as funções
da Iara são executadas pela Boiúna e pelo Boto.
Jaci - Ia-ci, a
Lua, a mãe dos frutos; o mês lunar e também um ornato. Irmã e esposa do Sol.
Merecia homenagens diferentes conforme a fase: Iaci omunhã (nova); Iaci icaua
(cheia). O cortejo lunar era formado pelo Saci-Pererê, o Boitatá, o Uratau e o
Curupira.
Jurupari - Ser
demoníaco (comparável ao Anhanga) originado de lendas tupis. Diz o mito que
era filho de uma virgem e foi enviado para o Sol para reformar os costumes
naTerra. Conquistou para os homens o poder que estava com as mulheres, mas
falhou na missão de encontrar uma noiva ideal para o Sol e, por isso, permanece
levando uma vida oculta na Terra. O nome "Jurupari" quer dizer que fez
fecho da nossa boca. Vindo, pois, de "iuru" (boca) e "pari"
(aquela grade de telas com que se fecham os igarapês e bocas de lagos para
impedir que o peixe saia ou entre). Era bastante temido pelos Tupis.
Mãe D'Água -
Na opinião de Câmara Cascudo, a Iara é simplesmente uma forma literária
brasileira para representar a lenda mediterrânea da sereia sedutora ou da Mãe
D'Água do folclore africano, e não um mito autenticamente brasileiro. O mito
autêntico, ligado à origem, aos mistérios e a temores da água, é o do
Ipupiara (o que reside ou mora nas fontes). Ao contrário do mito mediterrâneo
e do africano, o mito brasileiro do Ipupiara refere-se a um homem-marinho,
gênio protetor das nascentes e olhos d'água e como tal, de certo modo, inimigo
dos pescadores, marisqueiros e lavadeiras.
Papa-Figo -
Duende do ciclo dos monstros assustadores de crianças. Seria o
"lobisomem" das cidades. "...havia ainda o papa-figo, homem que
comia o fígado de menino. Ainda hoje se afirma... que certo ricaço de Recife,
não podendo se alimentar senão de fígados de crianças, tinha seus negros por
toda parte, pegando menino em saco de estopa". É um velho sujo, horrível,
esmolambado. Entrega doces, brinquedos e a narração de histórias para atrair
crianças à saída das escolas ou aqueles cujas babás são distraídas ou
namoradeiras. Alguns comiam, mas outros vendiam a potentados doentes o fígado
de seus pequenos prisioneiros.
Saci Pererê -
Mito do folclore Brasileiro, bastante difundido de a Norte a Sul, através de
inúmeras variantes: Saci Cererê, Saci Taperê, Mati Taperê, Matinta Pereira,
Martim Tapirera e Martim Pererê. O mito tem procedência ameríndia, de fonte
tupi-guarani. Teria sido, primitivamente, um mito ornitomórfico: pássaro
encantado e, ainda hoje, em diversas versões, o saci é uma ave.
transformou-se, depois, em mito antropomórfico: negrinho de um pé só, com uma
carapuça vermelha e cachimbo na boca. De todas as formas esta última é a mais
popular. É uma espécie de duende que vive de noite, a perturbar os viajantes e
tropeiros, pedindo fumo e fazendo-os errar os caminhos. É interessante que
mesmo nos dias atuais, entre os roceiros, coloca-se fumo para o Saci nos galhos
de árvores a fim de afastar as suas diabruras. Dizem que, de noite, faz trança
nas crinas dos cavalos e costuma assobiar e gritar: "Saci Pererê, minha
perna dói como o quê!". Tudo que se encontra revirado, da noite para o
dia, nas fazendas do interior, é atribuído a esse pitoresco demônio do
folclore Brasileiro. Além disso, tem especial prazer em azedar o leite, gorar
os ovos das galinhas e impedir o milho-picoca de rebentar. No extremo-norte,
onde a influência ameríndia é mais intensa, o primitivo mito ornitomórfico
sobrevive sob forma do pássaro encantado Matinta Pereira, que traz desgraças e
sofrimentos. A antropomorficação do mito primitivo primitivo primitivo
apresenta um influxo indireto do elemento negro. O Saci adquiriu feição de
moleque brincalhão. Outra transformação, mais complexa, é a versão de
Romãozinho, também um negrinho notívago que faz estripulias nos terreiros e,
às vezes, dentro das próprias casas. Em torno desse personagem se formou uma
lenda: Romãozinho era um negrinho desobediente e mau, que bateu em sua mãe e
foi condenado a perambular de noite pelos campos e matos.
Quibungo - do folclore afro-brasileiro, duende dos negros bantos.
Tupã - Mito
ameríndio (N. do Webmaster: Ameríndio, índio da América), do grupo
tupi-guarani. Os tupis o considerava personagem ligado aos trovões, às
tempestades, às chamas e aos raios, que lhe eram atribuídos e, igualmente, ao
ciclo dos heróis civilizadores, pois era crença de que havia ensinado aos
índios os primeiros rudimentos da agricultura. Na mitologia tupi-guarani,
entretanto, Tupã era um personagem de segunda ordem. Os catecúmenos (N. do
Webmaster: Catecúmenos, aqueles que se preparam para receber o batismo;
cristão novos) é que, já no período da colonização, principiaram a
valorizá-lo como entidade idêntica a Deus. É indispensável, pois, distinguir
o mito ameríndio, onde Tupã é apenas um demônio que provoca chuvas, raios e
tempestades, tendo uma missão civilizadora entre os homens, e o mito
sincrético de Tupã-Deus.
Tupi - Seria um
dos heróis povoadores do Brasil indígena, vindo com seu irmão, Guarani, de
remota e misteriosa região além-mar. Segundo a lenda, ambos formaram uma
nação que se dissolveu por intrigas femininas. "... Dois irmãos,
chamados Tupi e Guarani, viajando sobre o mar, elegeram ao Brasil, e com os seus
filhos, povoaram o país; mas um papagaio falador fez nascer a discórdia entre
as mulheres dos dois irmãos, donde surgiram a desavença e a separação,
ficando Tupi na terra, enquanto Guarani e sua família emigraram para a região
de La Plata".
Itacueretaba, antigo nome do que conhecemos hoje por Vila Velha, significa aproximadamente "A cidade extinta de pedra". Localizada a margem direita do rio Tibagi, o rio do pouso, na vasta e ondulada ibeteba, planície, que Saint Hilarie, maravilhado, disse ser o paraíso do Brasil.
Este recanto tinha sido escolhido pelos primitivos habitantes para ser Abaretama, terra dos homens, onde esconderiam o Itainhareru, o precioso tesouro. Tendo a proteção de Tupã, era cuidadosamente vigiado por uma legião de Apiabas, varões, que eram escolhidos entre os homens de todas as tribos, treinados para desempenhar a honrosa missão.
Os Apiabas tinham todas as regalias e distinções e desfrutavam de uma vida régia. Era-lhes, porém, vedado o contato com as mulheres, mesmo que fossem de suas próprias tribos. A tradição dizia que as mulheres, estando de posse do segredo do Abaretama, o revelariam aos quatro ventos e, chegada a notícia aos ouvidos do inimigo de seu povo, estes tomariam o tesouro para si. Por justiça, Tupã, o onipotente, deixaria de resguardar o seu povo e lançaria sobre eles as maiores desgraças se o tesouro fosse perdido.
Os Apiabas eram fortes, altivos e bravos; o seu único trabalho consistia em realizar jardins na terra daquelas planícies. Tupã não permitia que, naquele recanto sagrado, houvesse o pecado.
Numa certa época, Dhui, em nossa língua corresponde a Luis, fora escolhido para chefe supremo dos bravos guerreiros. Como todos os outros, tinha sido preparado, desde a mais tenra infância, para essa sagrada missão. Dhui, entretanto, não desejava seguir aquele destino, celibatário. Seu sangue achava-se perturbado pelo feminil fascínio, era um chunharapixara - mulherengo.
As tribos rivais ao terem conhecimento da notícia, de pronto resolveram aproveitar-se da situação e escolheram entre uma de suas donzelas a que deveria ir tentar o jovem guerreiro e tomar-lhe o coração para arrebatar-lhe o segredo. A escolhida foi Aracê Poranga - Aurora Bonita. Não lhe foi difícil conseguir a atenção do ardoroso Dhui e, pouco a pouco, ia entrelaçando-se a sua habilidosa teia, de tal modo que ele ficou completamente apaixonado e subjugado a seus pés.
Ela já havia entrado no Abaretama com o consentimento de Dhui, que não teve como resistir-lhe ao desejo. Mas Aracê era mulher e Dhui homem. Traiu seus parentes em nome do amor, como ele traiu a sua missão em nome dela. Numa tarde primaveril, quando os Ipês, árvores de casca, já florescidos deixavam cair suas flores douradas numa chuva de ouro, Aracê veio ao encontro de Dhui trazendo uma taça de Uirucuri, o licor dos butiás, para embebedá-lo; mas o amor já dominava sua razão e ela também tomou o licor e ficaram quedados a sombra do Ipê; langüidamente entrelaçados.
Tupã vingou-se desencadeando um terremoto que abalou toda a planície. A fúria divina convulsionou-se dentro do solo e a região foi destruída, trazendo morte e dor. A Abaretama completamente destruída tornou-se pedra, o tesouro aurífero fundiu-se e liquidificou-se, e os dois amantes castigados ficaram um ao lado do outro petrificados. Ao seu lado ficou a causa de sua desgraça, a taça de pedra ...
E, quando ali se passa ainda se pode ouvir o vento repetindo a última frase de Aracê: Xê pocê ô quê - dormirei contigo. E assim Abaretama tornou-se Itacueretaba.
A terra se fendeu: são as grutas que encontramos próximas a Vila Velha e o tesouro fundido é aquela lagoa que chamamos de Lagoa Dourada, a qual quando o sol lhe bate em cheio, ainda reflete o brilho aurífero.
Dhui e Aracê,
equivalente indígena de Adão e Eva, estão ainda hoje lado a lado circundados
de Ipês descendentes daqueles que assistiram a morte dos dois. E os
sobreviventes daquele povo partiram para outras terras onde a maldição de
Tupã não os alcançasse. Fundaram outro império, nessas terras imensas da
América do Sul.
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